sexta-feira, 15 de julho de 2016

Holocausto Brasileiro

   Muitos nem acreditariam se ouvisse essa história na rua, muitas crianças morreriam de medo e ficariam apavoradas caso seus pais ou avós escolhessem essa história para colocar medo nelas.
Dia 12 de outubro de 1903 foi inaugurado o Hospital Colônia de Barbacena, hospital psiquiátrico dedicado as pessoas alienadas de Minas, o hospital tinha 200 leitos, mas em 1961 atingiu a marca de cinco mil pacientes, 70% das pessoas que viviam naquele hospital não tinham doença mental alguma, era enviado de todos os cantos do Brasil, através de trem, pois havia uma linha de trem atrás do hospital, mulheres que engravidavam antes do casamento, prostitutas, homossexuais ou pessoas que não estavam no padrão da sociedade e sofriam com isso. Lá eles eram deixados para sofrer e morrer, os tratamentos oferecidos não era nada racional, como por exemplo, o antigo tratamento de choque, já extinto da psiquiatria.
   Eu nasci e vivi minha vida toda em Barbacena, porem só fui tomar conhecimento dessa história em 2013, onde o assunto começou a ficar polêmico, li e recomendo o livro Holocausto Brasileiro, escrito por Daniela Arbex, O Hospital não só recebia pessoas sem nenhum diagnóstico de doença, como também não tinha estrutura nenhuma pra receber aquelas pessoas, elas não tinham o que comer e nem onde dormir, comiam ratos e bebiam água do esgoto, dormia uma por cima da outra, cada pessoa tinha um conjunto de roupas, aqueles pijamas listrados como vimos no filme "O menino do pijama listrado" que vivia em um campo de concentração nazista. Mas o Hospital não foi comparado a um campo de concentração apenas pelo uniforme, mas também pela quantidade de vitimas que deixou marcado na história. Desde sua inauguração em 1903 o hospital deixou 60 mil mortos, esses os que conseguiram identificar. Centenas de pessoas eram descartadas todos os dias; Eles dormiam um por cima do outro por conta do famoso frio de Barbacena, no inverno era rigoroso e nem os próprios moradores o aguentava, O hospital recebia verba para tudo, para a alimentação dos pacientes, para as vestes, para os tratamentos e para o dia a dia, mas esse dinheiro nunca foi visto. Absolutamente todo o trabalho feito dentro do hospital era feito pelos pacientes, desde cuidar da horta a construir casas, As pessoas que ali se encontravam não eram loucas, não tinham motivos de estar ali e morriam no esquecimento de amigos e familiares por motivos insignificantes. Lá dentro eles faleciam, e seus corpos desapareciam, muitos parentes chegaram a procurar, mas não tinham noticias, não tinham corpo pra enterrar e não tinham muitas vezes nem um atestado de óbito, pois nem todos os mortos tinham a morte registrada de maneira correta, O hospital também vendia corpos para faculdades de medicina de Barbacena e até mesmo de Juiz de Fora, cada corpo era vendido por em torno de R$200,00, estima-se que 1863 corpos foram vendidos a faculdades. Mulheres eram constantemente estupradas lá dentro, muitas vezes na frente de todo mundo e ninguém fazia absolutamente nada,. Quando acontecia do estupro resultar em uma gravidez, a criança era abortada, morta logo ao nascer ou era direcionada a adoção. É muito difícil lidar com tamanha perda, crianças, adolescentes, homens, mulheres, idosos, todos tiveram sua existência apagada pelo Colônia, O hospital ainda está lá, muitos acreditam que ele é mal assombrado, eu também acredito que seja, mas não pelos pacientes que ali habitaram, mas sim pelos monstros que tiveram coragem de fazer tantas maldades. 
   Em 1980 o Hospital Psiquiátrico foi desmascarado, o fotógrafo Luiz Alfredo do jornal O Cruzeiro que na época era um dos melhores jornais do País, fotografou todo o horror que presenciou lá dentro e disse "Era como estar em um campo de concentração", mostrando ao publico o que realmente acontecia dentro daqueles muros altos. O hospital recebeu a visita de um psiquiatra italiano, Franco Basaglia, que havia feito a reforma da psiquiatria na época, que determinava que Tratamento de choque entre outros, não faziam o menor efeito, horrorizado com o estado do hospital, e responsável por nomear tal como "campo de concentração", o psiquiatra então exigiu o fechamento imediato do hospital. Hoje, 51 anos após o inicio do massacre, não tivemos nenhum punido ou responsável pelo acontecido. Após o fechamento, pacientes sobreviventes foram encaminhados para instituições e por direito recebem uma pensão do governo, sim, teve sobreviventes. Porem eles sofrem até hoje ao lembrar-se de tudo que passou dentro daquele inferno. Eu nunca vou me conformar como algo tão covarde pode acontecer e ninguém fazer absolutamente nada, É uma falta de respeito com a humanidade, com os moradores, com os parentes daqueles corpos que tinham uma família, que tinham história. O mais triste é saber que Barbacena escondeu e camuflou isso por anos, e só a alguns anos isso foi mostrado para o mundo todo. É vergonhoso saber que pessoas eram tratadas assim, seja no hospital, nos campos de concentração ou em qualquer outro lugar, quem faz psiquiatria ou psicologia por amor entende a dor disso. 

"Os que aqui estão não são loucos, os que não estão são." 
Foi encontrada uma lata fora do Colônia com essa escrita, provavelmente feita por um dos pacientes,