sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Racismo x Vitimismo


            Hoje em dia existe uma grande polêmica em torno de racismo. A um grande número de pessoas que se sentem na posição de falar o que é racismo e o que deixa de ser. O que é o famoso “vitimismo”. Em primeiro lugar gostaria de dizer que esse não é meu lugar de fala, mas como branca que reconhece seus privilégios e que tem um público extenso, me encontrei no dever de escrever sobre o assunto. Faço questão que esse texto seja revisado por pessoas confiáveis e peritas no assunto, para anular perigos de erros.

O que é lugar de fala e qual é o meu?
O termo lugar de fala no Brasil ficou famoso através da filosofa Djamila Ribeiro em seu livro O que é lugar de fala? O termo trata-se de sujeitos que pertencem a determinados grupos sociais e se sobrepõe em questão de experiencias individuais. Ou seja, uma pessoa que sabe o que está falando porque passa por isso. Por exemplo, negros têm total fala a respeito de racismo. Isso não significa que brancos não possam falar sobre racismo, só significa que não tem total credibilidade por que não sente ele na veia todos os dias. Mesmo que conheça negros, não é negro. Então saiba onde seu papel em cada assunto começa e o mais importante, onde acaba.
            Voltando ao assunto principal, tenho certeza que pessoas (maioria) que falam que racismo é vitimismo, não são negras. “Ah, mas eu tenho conhecido negro”. Não importa, você falar que algo que você não passa, que você não tem que sentir na pele é vitimismo, é muito fácil. Você nunca foi considerado suspeito ou até mesmo culpado por sua cor de pele. Você nunca foi expulso de um estabelecimento ou mal atendido por sua cor. O racismo está tão enraizado que as pessoas brancas ainda acham que tem direito de denominar ou selecionar quem sofre racismo e quem não. Eu já expliquei aqui no blog a diferença entre racismo e injúria racial. Basicamente é: Racismo é se sentir superior ou se colocar superior a alguém usando como justificativa a cor, injúria racial é ofender ou não respeitar alguém pela cor. É ai que entramos com o discurso de “Racismo reverso”. Vou pontuar argumentos que provam que isso não existe.
1º: Racismo se refere a raça, de forma geral, não apenas a negros.
2º: Negros não é a única raça que existe.
3º: O principal do racismo consiste em soberania, se impor a uma minoria, controlar, se considerar superior e pura. Desde que o mundo é mundo não vemos os negros controlando brancos, sendo superior ou torturando.
                  Se, eu digo SE existisse, seria apenas racismo. Porém não existe levando em consideração o ponto 3. “Então é considerado injúria racial já que me chamavam de palmito, leite azedo quando eu era criança?”Não. Porque você nunca perdeu ou vai perder um emprego, deixar de comer em um restaurante por ser branco. Você nunca vai ser mal atendido ou mal recebido por isso.
O racismo está cada vez mais enraizado em nosso dia a dia. Você não precisa estar escravizando alguém para ser racista, você não precisa falar diretamente com um negro para ser racista, você pode ser racista, usar termos racistas ou até gestos que podem ser racistas. Uma cara feia, um comentário maldoso, não querer convivência ou não querer em seu estabelecimento. E você usar termos racistas não significa que você seja uma pessoa racista.
Vou citar exemplos de atitudes racistas que talvez você tenha e não saiba. Talvez você conheça muitos termos que são racistas e nem tem esse conhecimento.
  • Criado mudo: Quando parei para analisar esse termo e depois tive conhecimento da história, eu fiquei definitivamente muito chocada, o termo se enraizou na sociedade e o móvel de cabeceira ficou conhecido pelo nome “criado mudo”, o que muitas pessoas não sabem é que esse nome se dá por conta dos tempos de escravidão, onde um escravo ficava sentado ao lado da cama do seu senhor, esperando uma ordem.
  • Mulato: Muitas vezes vindo em tom de elogio, mulata(o) é um termo muito usado para se referir a uma mulher(homem) NEGRA(O), porem mais clara. Esse termo era usado também na época de escravidão, para nomear as pessoas que eram filhas de escravas e o “senhor”. Mulato vem do animal Mula, cruzamento de cavalo com jumenta, ou jumento com égua.
  • “Você é um(a) negro(a) tão bonito(a)”: Também em uma tentativa de elogiar, quem usa essa frase muitas vezes acaba ofendendo. Soa como se apenas aquele negro fosse bonito, os outros não.
  • “Vou te colocar no tronco”: Tendo em vista a tentativa de um castigo ou corretivo, a pessoas acaba se referindo a um passado de tortura, onde o tronco era usado para prender negros e tortura-los em tempos de escravidão.
  • Mercado negro, lista negra, denegrir, inveja branca: Normalmente vemos branco ser usado como algo bom e positivo e negro como algo ruim, feio e sombrio.
  • “Não sou tuas negas”: A mulher negra luta diariamente contra a objetificação enraizada da mulher negra, desde a escravidão a mulher negra é usada como símbolo sexual e objeto de prazer pelos senhores brancos. Mulheres brancas eram pra se casar, negras pra se divertir sexualmente.
                 “Nossa Carol, mas você está exagerando”, Ah jura? Então faz o seguinte, inverta as situações. Vamos de exemplo, teria qual sentido se referir ao mercado como “mercado branco”? Ou lista branca, você já elogiou um branco dizendo “nossa você é um branco tão bonito"? Acredito que não. Quando for pensar em uma situação, coloque ao contrário. Se ficar a mesma coisa, ok. Se não, reveja seus conceitos. Isso não é vitimismo, isso é igualdade. Colocar 2 seres humanos na mesma posição mesmo que ela não seja a mesma. Porque se você for analisar de perto os brancos que se fazem de vítima, os brancos que tentam se desvencilhar de sua culpa e sua história suja de racismo. O racismo e o preconceito não morreram junto com a escravidão. O branco ainda tem muito conta a pagar e podemos começar ouvindo o que eles têm a dizer calados. Ok, te entendo. Não fomos eu ou você que escravizamos os negros há mais de 130 anos. Mas nós ainda estamos colhendo os privilégios pelos nossos antepassados terem o feito. Se você olhar bem de perto e com olhar crítico, você encontra. O Brasil é um dos países que existe mais variedades de raças e etnias no mundo, mesmo assim ainda luta diariamente pras pessoas brancas aceitarem que negros também são seres humanos, e são seres humanos que carregam uma marca eterna de dor, dor que os nossos antepassados causaram. Aproveite e pense que o que você fizer agora e não colher em sua vida, os seus próximos irão. Não é vitimismo, jamais foi e jamais será.
O que nós brancos podemos fazer pelo racismo?
Acima de tudo admitir que ainda existem vestígios da escravidão e que os negros de hoje ainda sofrem com eles. Admitir que ainda colhemos os privilégios disso. Tentar abrir os olhos de quem conhecemos a respeito disso e indicar pessoas que entendam do assunto para que eles aprendam com quem tem poder de fala.